I
Bem-vindo ao meu bar. Vamos, entre e sinta-se à vontade.
Meu nome é Chapel e se você está aqui deveria saber quais
são as regras, então é bom travar essa sua pistola ou vai ter que se ver
comigo. Ninguém puxa briga por aqui, caso aconteça, é melhor ir lá pra fora ou
seu atendimento vai ser cortado. Não me importa que durma em cima da mesa de
bilhar ou que fique jogado no chão perto do banheiro ― a escolha é sua ―, mas é
bom manter a ordem nesse lugar.
Aqui está sua cerveja. Olhe a sua volta, meu camarada, não
precisa se preocupar. Vê aquele tipo ali com o terno e a moça bonita? Um
vampiro seduzindo sua garota. O rapaz de cabelo comprido e óculos escuros? Um
caçador. Provavelmente aqueles dois vão sair no braço mais tarde, mas com
certeza não vai ser aqui. “Na casa do
Chapel, ninguém se estranha”. Afinal de contas, são todos estranhos
conhecidos.
Não é fácil saber quem pode com quem e quem não pode. O
importante é saber que esse é um lugar neutro. Sem brigas, sem intrigas. Só
bebida e conversa amistosa. O Princesa já foi usado por muita gente como ponto
de encontro, Bakargys mais novos se reúnem aqui ― ainda não se acostumaram com
a falta de álcool ―, Bakers e o Bando da Lua também passam muito aqui.
E como um homem de mais de cinquenta anos, com uma bela
barriga de chope e falta de cabelo mantém o lugar calmo? Bem, gosto de pensar
que o bigode impõe respeito junto com a camisa de flanela, mas a verdade é que você
deve respeitar aquele que mexe com a sua bebida e comida, nunca se sabe o que
eu posso fazer com ela antes de te servir. Caçadores e magos se acham muito
espertos, a maioria não acredita que meu passado é muito mais assustador do que
o presente deles, mas eu já tive minha cota de desventuras por uma ou duas
vidas. Desde baixinhos de tapa-olho até mesmo deuses andando sobre as minhas
terras.
Mas eu prefiro o anonimato sutil de que sou “apenas um
barman velho que desconfia de algumas coisas”. Já abriguei muitos filhotes
perdidos por aqui e também já tive que costurar muita gente por outros
desrespeitarem as minhas regras. Quão difícil é entender que eu não quero
brigas aqui? Isso me lembra de que certa vez...
II
Todo o bar ficara em silêncio quando me viram saltar do
balcão até a briga no meio do salão. Um tipo engraçado, provavelmente europeu,
segurando uma pedra dourada tentava acertar o garoto, afilhado do Coiote.
― Escuta aqui, cara, qual é a regra número um do meu bar?
― Sem confusão ― o desgraçado me respondeu, baixando aquele
amuleto e desviando o olhar para o chão.
― E qual é a segunda?
― Não tinha segunda... ― ele me olhou confuso
― EXATO! Só há uma única regra e você conseguiu quebra-la!
Qual é o seu problema?
― Eu... Eu...
― Você, você, ah, cala essa boca! ― interrompi.
Peguei-o pelo colarinho e saí arrastando para fora do bar.
Nem mesmo as moscas ousavam fazer qualquer ruído. Do lado de fora, arregacei as
mangas da camisa e mostrei pra ele com quantos braços se inabilita um
estrangeiro desrespeitoso. Se você quer a resposta, só dois. Os meus dois.
Deixei o sujeito caído na terra e entrei. Ainda estavam em
silêncio, acho que me ouviram, mas tudo bem. Dei a volta no balcão, apanhei o
trapo velho e um copo e comecei a limpar distraidamente. Olhei para frente e
perguntei:
― Então, alguém mais quer alguma coisa?
E assim voltou a normalidade da noite. Ou o mais normal que
um bar de anomalias pode vir a ser.
III
Esse é o meu bar. Um lugar onde os perdidos encontram
refúgio e os refugiados encontram seus caminhos uma hora ou outra. Não me
importo em como eles se parecem. Estão aqui para fazer as notícias correrem da
melhor maneira que podem e para beber e relaxar um pouco. Não poderia ser
diferente, todo mundo precisa de um descanso. Todo mundo.
Afinal de contas, não é porque você não dorme que não vai
querer relaxar. Eu relaxaria.
Os tipos mais comuns pra mim podem ser os mais incomuns pra
você, mas, não esquenta uma hora você se acostuma. Vai ver que essas situações
confusas da realidade são mais e mais comuns cada vez que você chafurda nesse lamaçal
que é a vida do submundo. Por que esse é só mais um dia por aqui com mais uma noite
sem dormir e, se você der sorte, mais uma briga e nenhuma confusão no bar. Não
no meu bar, amigo.
Mas, então, qual é a regra da casa?
(Arte por: JOuey-)