I
Maio de 2013
A noite estava clara, a Lua cheia iluminava a plantação, nós
estávamos parados próximos à estrada, sentados em lugares diferentes no mesmo
carro. Eu estava sentado no capô, o cigarro aceso, rindo da situação de
momentos atrás. Lucas Baker estava dentro do carro, procurando alguma estação
de rádio que prestasse. E Hector Acaiah voltava do porta-malas com o caixote de
gelo com as cervejas que conseguimos, dando uma para cada.
Em contraste comigo, um tipíco punk dos anos oitenta, Lucas
era menor e parecia um skatista de cabelo tão curto que chegava a parecer
careca. E ainda mais em contraste, Hector era um cara grande, de cabelo escuro
ondulado e mantinha um sorriso o tempo todo ― ele estava sempre calmo.
Após o brinde, tentamos entender o que havia acontecido
naquela noite. As coisas estavam mesmo fora do comum, mesmo para nós. E
tinhamos um Baker conosco!
― Sabe, para um anjo
da guarda, você consegue nos enfiar em cada enrascada, Hector ― Lucas
comentou.
― Vindo do curandeiro
arriscado isso não significa um problema ― ele retrucou ― Achei que fosse
você quem gostasse de riscos.
― Touché.
Eu permaneci em silêncio, bebendo de minha cerveja e
observando o céu. Meu cigarro queimava lentamente entre meus dedos.
― Jack, o que foi? ― Hector perguntou, agitando a mão em
frente ao meu rosto ― Ainda está aí?
― Estou ― respondi ― Só acho que não deveríamos ter saído do
bar, Hec.
Antes de termos parado o carro naquele lugar, estávamos no
bar Princesa. Bebendo e nos metendo em problemas ― como era de costume ―, até o
momento em que Hector se agarrou com uma garota ali e descobrimos, da pior
forma, que ela não podia ser tocada por homens. Ela era uma cobaia de alguma
experiência de bruxa ou brinquedinho de uma bruxa, eu não tinha certeza ainda.
O que sabemos é que Chapel nos pediu para sair do bar assim
que Eve apareceu. A dona da moça com
quem Hector estava envolvido no momento.
O Princesa pode ser um bar neutro, mas só é neutro até o
momento em que alguém puxa briga com alguém dentro do estabelecimento.
― Acho errado alguém pertencer a outro alguém ― comentei ―
Oras, nós somos os mocinhos não
somos?!
― Olha, isso que o Lunewalker falou tem sentido, Hector ―
Lucas disse ― Se nós não somos mais os caras
bons, esqueceram de me avisar disso aí.
― Bem, vendo por esse lado, a razão está com vocês, meus
amigos ― Hector ergueu sua cerveja ― É parte de minha demanda salvar aqueles
que precisam de ajuda.
― Estamos agora em uma missão celestial? ― Lucas perguntou ―
Um anjo da guarda, um caçador lupino e um curandeiro insano? É isso que o mundo envia para salvar algumas
donzelas em perigo?
― Ah, cala a boca, Lucas ― retorqui ― É hora de caçar a
bruxa malvada!
Brindamos.
― E como Jack deixou a Alma
do Deserto em casa, hoje estamos por conta da Verônica aqui ― Hector deu leves tapinhas no teto de seu carro. ―
Parece justo pra mim.
II
Carros nunca foram meu meio de locomoção favorito, mesmo que
sejam úteis para levar mais gente e também mais armamento. Eles não me dão a
sensação de liberdade que uma motocicleta trasmite.
Mas mesmo assim, estávamos, de madrugada, rodando pela
cidade em busca de alguma pista da bruxa
malvada. Hector estava calado, dirigindo. Lucas brincava com o rádio, ainda
procurando alguma música que o agradasse. E eu estava deitado no banco de trás,
o braço sobre os olhos.
Em um solavanco, eu me levantei.
― Foi mal ― Hector disse ― Achei que estava dormindo.
― À noite? ― perguntei.
― Bom ponto.
― Galera, diz aí... ― Lucas começou ― Como é que nos vamos
encontrar a bruxa, mesmo? Digo, o olfato do Jack não é tão bom assim. Ele
precisaria conhecer o cheiro dela e estar no rastro, teria que ser recente.
― Vamos dar um jeito, careca ― respondi.
― E parece que acabamos de encontrar esse jeito ― Hector disse,
indicando o carro preto parado em frente à um beco. Não parecia um casal se
agarrando, estava mais para uma briga de vampiros, tipíco. ― Estão prontos,
senhores?
― Sempre ― Lucas tirou do bolso luvas de ciclismo e as
colocou. ― Hora de brincar.
Enquanto Hector era um cara calmo, Lucas sempre foi do tipo
que adorava uma boa briga, uma boa
confusão, e se atirava no perigo o quanto fosse possível. Ele sempre
acabava bem... Bakers e seus costumes.
Saímos da Verônica e fomos até o carro parado. O beco estava
agitado, três caras e duas garotas. Uma delas estava no chão, caída e a outra
estava encostada contra a parede, enquanto os três se dirigiam para ela,
sorrindo.
― Ei sanguessugas ― eu disse, chamando a atenção e tirando
minha pistola da cintura, mirando neles.
Um tiro. Dois tiros. Três tiros.
O primeiro tiro acertou um deles direto na cabeça, que caiu
com um baque surdo no chão. Os outros dois conseguiram desviar, a garota se
encolheu no chão, protegendo a cabeça com as mãos, chorando.
Os dois vieram para cima de nós, Lucas se adiantou a minha
frente e ficou parado, esperando o impacto. Hector estava parado, de braços
cruzados.
O primeiro atingiu Lucas, que sequer se mexeu quando foi
atingido. Arremessado com o impacto, ele sorria. Sangue escorria de sua boca.
― Alguém sabe bater ― ele riu ― Minha vez.
Ele se jogou contra o que o atingiu e acertou-o na
mandíbula, quebrando-a. Ele não tinha limitações sobre sua força, estava sempre
pronto para chegar ao limite de seu corpo.
O segundo se adiantou para cima de Lucas, mas Hector o
agarrou pelo pescoço. Ele abriu a boca dele, arrancando-lhe as presas de
vampiro.
O vampiro olhou desesperado. Hector sorriu, mas seus olhos
estavam sérios. Uma forte luz descia do braço de Hector, indo até o vampiro,
entrando por seu pescoço e espalhando-se por seu corpo.
― Que deus tenha piedade de sua alma, se você ainda tiver
uma.
A luz preencheu o beco, eu me encostei contra a parede,
próximo a garota, cobri-a com minha jaqueta. Ela precisava de ajuda, aqueles
dois poderiam cuidar daquilo.
Quando a luz passou, o corpo do vampiro se desfazia em
cinzas. Ele limpou as mãos e olhou para mim.
― Tipíco, eu sabia que você ia acabar perto da garota Jack.
― ele disse ― Como ela está?
― Em choque, mas vai ficar bem ― respondi ― O que você fez
com o cadáver?
― Exorcismo celeste.
Muito útil.
― Percebi. ― sorri ― Vai acabar nos deixando mal assim.
― Nah, não é algo que se possa fazer o tempo todo. Três
vezes ao dia é o meu limite. ― ele respondeu ― Cadê o Lucas?
― Quando vi, estava batendo no outro vampiro.
― Espero que ele não o mate, precisamos de informações.
― Eu sei disso ― ouvimos sua voz, vinda de fora do beco ― Só
que vamos precisar de um tempo.
Levantei a garota em meus braços e saímos dali. O carro
negro parado estava destruído, Lucas e o vampiro provavelmente tinham acabado
com ele em sua briga.
Lucas estava com os punhos cobertos de sangue e o ferimento
em sua boca sangrava bastante, mas ele continuava sorrindo. Nem mesmo estava
cansado.
O vampiro, por outro lado, estava desmaiado próximo ao
meio-fio, a mandíbula partida, os braços quebrados ― virados em ângulos
impossíveis, se não estivessem ― e uma de suas pernas fora arrancada. Estava
jogada do outro lado da rua.
― Me lembra de nunca sair no braço com um Baker empolgado ―
Hector disse, sorrindo. ― Na verdade, me lembre apenas de nunca sair no braço
com um Baker.
― Feito ― respondi ― Agora, quer abrir o carro? A garota
precisa ir pro hospital. Você a leva enquanto damos um jeito nesse sanguessuga?
― Claro. ― Ele respondeu.
Eu a coloquei no banco de trás, deitada, deixei minha
jaqueta para cobri-la e Hector entrou no carro, antes de partir ele nos disse:
― Não façam nada divertido sem mim.
Lucas limpou o sangue de seu rosto com as costas da mão e
acenou para ele. Voltamos nossa atenção para o vampiro.
― Caralho, cara, o que você fez com ele?
― Bati nele.
― Eu sei disso, animal, eu só quero saber de onde veio tanta
raiva pra isso tudo.
― Ah, já fazia um tempo que eu estava sem me exercitar. Acho
que eu, realmente, me empolguei.
― Vocês, Bakers, são intrigantes. Nem está cansado, está?
― Sabe que não. Não sabemos o que é estar cansado, ou o que
é dormir, não depois da puberdade. ― ele respondeu.
― Certo, o que fazemos agora com esse troço? ― indiquei o
sujeito desmaiado. ― Precisamos perguntar coisas à ele. Saber se ele sabe da
Eve.
― Ele sabe.
― Perdão?
― Olha a mão dele.
Abaixei-me sem dizer nada, observei as mãos do vampiro por
alguns segundos. A direita só estava destruída, mas a esquerda tinha uma marca.
Uma runa tatuada. Duas cobras se entrelaçando, formando um E.
Levantei e puxei do bolso um cigarro, acendi.
― A marca dela? ― perguntei.
― É.
― Perfeito.
― Certo, hora de bancar o curandeiro aqui...
― Fique à vontade.
Lucas se abaixou, estendendo as mãos sobre o vampiro
inconsciente. As feridas dele se fecharam lentamente, enquanto Lucas parecia
ficar mais e mais cansado. Ele podia ser um bom curandeiro, mas era arriscado. Sua habilidade natural era a
da cura, mas era um problema para ele. Ela esgotava muito de sua energia vital.
Quando o vampiro despertou, puxei Lucas para longe dele. O
vampiro tentou atacar, mas ainda não tinha uma perna e seus braços haviam sido
curados do jeito que estavam, sem coloca-los no lugar. Estava impossibilitado
de qualquer coisa, exceto falar.
― O que fizeram comigo?! ― ele gritou
― Sem gritaria. ― a pistola estava apontada para sua
garganta ― Qualquer coisa que disser, seu bostinha, pode e será usada contra
você.
― Jack, essa foi a sua pior referência essa noite. ― Lucas
olhou para mim, batendo a mão em sua face ― Sério.
― Eu sempre quis dizer isso num interrogatório. ― Sorri e,
me voltando ao vampiro, ― Então, desgraçado, comece a cantar.
― Cantar? O que diabos quer dizer com isso?!
― Eve. ― Lucas repondeu ― Sabemos que está com ela. Que pertence à ela.
― Eu prefiro que me matem!
― Ah, mas nós vamos, mas antes você vai falar ― engatilhei.
Dei um tiro em sua perna restante.
― Isso foi um aviso, agora fale.
III
Já estávamos com Hector outra vez. Ele deixou a garota no
hospital, disse às enfermeiras que ela tinham tentado estupra-la e ele a salvou
― coisa de anjo da guarda. Nos encontramos no mesmo beco em que ele nos deixou
com aquele vampiro destroçado. Conseguimos as informações necessárias, Lucas
acabou com ele quando terminamos. Só precisávamos, agora, ir até o esconderijo
da bruxa.
― Sério, eu nunca vou entender essa associação de vampiros
com bruxas ― eu disse, enquanto carregava minha pistola, sentado no banco de
trás ― Será que só os Bakargy tem bom senso?
― Talvez sim, talvez não ― Hector respondeu ― Estou no
caminho certo, não estou?
― Sim.
Lucas apanhou um taco de baseball que Hector guardava em seu
carro. Estava entalhado com runas desconhecidas, mas logo assumimos que era o
idioma celeste.
― Por que nunca te vi usar isso, Hec? ― ele perguntou ―
Parece tão descolado.
― Eu nunca precisei dele.
― E o que ele faz?
― Nada que outros tacos não façam.
― E o que ele faz além disso?
― Acaiah.
― Seu sobrenome? ― perguntei
― Não, Acaiah não é meu sobrenome. Eu sequer tenho um. ― ele
respondeu ― Acaiah é anjo da guarda.
Minha casta, sou um anjo guerreiro que serve ao arcanjo Gabriel, vocês sabem
disso.
― É, mas sempre achamos que esse era seu sobrenome ― Lucas
disse ― E o que isso tem a ver com o
taco?
― Ele é só um taco, Lucas. Eu só estou pegando no seu pé. ―
Hector riu.
― Maldito ― Lucas riu também ― Então, posso pegar emprestado
pra hoje?
― Claro.
Não demorou muito mais para que chegassemos. Estávamos em
frente a uma casa de dois andares. Próximos ao cemitério da cidade. Tipíco para
uma bruxa de almas. Como nunca pensamos nisso antes?
Entramos na casa sem dificuldades. O problema mesmo foi os guardas. Mais alguns vampiros estavam
ali, parados, como se nos esperando.
Seguimos em uma luta rápida. Eu guardei a pistola, usando a
faca de prata contra eles. Vampiros, tão ou mais sensíveis à prata quanto
lobisomens eram. Feitos em cinzas, esmagados pelo bastão, ou com cabeças
arrancadas pelo estilo de luta celestial, nós conseguimos limpar a área.
Mas nada da bruxa.
Pus meus sentidos para trabalhar. Não havia nada que ver
ali, mas talvez eu pudesse ouvir ou farejar alguma coisa. Dois pontos para o homem-lobo. Sons e cheiros. Eu poderia
até escolher.
― Caras, segundo andar. Vão indo na frente, vão lidar com
mais alguns cadáveres e encontrar a bruxa. A única mulher ali. ― me virei,
tomando o caminho contrário, indo para o porão.
― E você?
― Eu vou salvar uma donzela em apuros.
― É um cachorro mesmo. ― ouvi Lucas dizer, antes de eu descer
as escadas.
No porão, encontrei uma garota amarrada. Estava amordaçada,
chorava e tinha cicatrizes finas sobre o rosto. Torturada? Como uma tortura
deixa marcas tão leves? Eu não tinha tempo para pensar sobre isso na hora,
precisava tirar ela dali.
― Vai ficar tudo bem, guria.
Eu a desamarrei. Levei um gancho que me tirou os óculos.
― Vadia... ― murmurei ― Transformação recente, não é? Por
isso você ainda tem cheiro de gente.
Ela tirou a mordaça e mostrou suas presas. Uma vampira nova.
Ela estava em instinto puro, não tinha qualquer talento ou noção de como lidar
com suas novas habilidades. E eu, bem, eu tinha isso à meu favor.
― Filhote de sanguessuga, tão simples de lidar contigo. ―
acendi meu isqueiro.
Ela ainda não havia visto luz desde a transformação, ela
ficou cega por tempo o suficiente para que eu pudesse cortar sua cabeça com
minha faca de prata.
― Uma pena, uma garota tão bonitinha... ― acendi outro
cigarro antes de guardar o isqueiro ― Bem, tem gente que não tem sorte na vida.
IV
Eu tive que correr, meu instinto dizia que era preciso
correr. Eu sentia que meus amigos estavam com problemas e que precisavam de mim
com eles. Eu não podia deixar meus amigos na mão, não era meu modo de viver.
Antes de subir as escadas para o segundo andar, verifiquei
minha arma, estava carregada, pronta pra uso. Subi as escadas, atravessando
dois degraus por vez, chutei a porta e entrei. Pé na porta e tapa na cara, era esse o pensamento que estava
impulsionando minhas ações.
O lugar estava mal-iluminado, umas poucas velas preenchiam o
lugar. Hector e Lucas estavam se erguendo de uma recente queda. O cheiro ali
era óbvio, cheiro de cinzas e enxofre ― eles haviam destroçado vampiros.
― Ei vadia ― eu disse ― Você não vai mais machucar os meus
amigos.
Ao centro do pentagrama, ao lado de uma garota
insconsciente, estava uma mulher. Pele morena, cabelos e olhos escuros, vestido
negro ao estilo Mortícia Adams, tatuagens
cobriam sua pele nos braços e pernas, o rosto era bonito, mas parecia apenas
uma impressão. Como se não fosse humana, era apenas uma lembrança da mulher que
existia antes de se tornar a bruxa ali presente. Eve.
Ela riu com minha afirmação, a língua de fora, me encarando
como uma sucúbo encara um homem a quem deseja. Eve era estranha, todo um jeito
de mulher, mas também de monstro.
― Olá, monstro ― sua voz era suave, mas causou-me arrepios ―
Chama isso de amigos? Fracos. Que não
conseguem nem mesmo se manter de pé.
Ela estendeu a mão, meus amigos voltaram ao chão. Como se a
gravidade ao redor deles tivesse se tornado mais pesada, obrigando-os a se
curvar perante ela.
― Olha, vadia, eu não sou um monstro. ― retorqui ― Eu sou
aquele que veio te mostrar que está errada, mas também sou seu executor. Seu carrasco.
Levantei meu braço, estendendo a arma à sua frente. Estava
pronto para atirar, puxei o gatilho. O leve coice confirmou que o disparo foi
efetivo, mas a bala nunca chegou à seu destino.
Perto do pentagrama, a bala se desfez em cinzas, enquanto
Eve ria. Fechei minha expressão. Se armas de fogo não funcionariam, eu
precisaria usar uma tática diferente de combate. Soltei a arma no chão e puxei
a faca da cintura.
Com ela em mãos, avancei. Eve me encarava, sorrindo. Hector
e Lucas ainda não estavam livres de seu domínio. Eu sabia que não podia com ela
sozinho, magia não é fácil de lidar quando se está contando apenas com o
físico. Mas quem não arrisca, não petisca.
Meus passos foram observados com atenção pela bruxa, ela
sequer se moveu. Eu estava a um passo do pentagrama quando aconteceu. Como se
houvesse uma barreira me impedindo de alcança-la, eu não podia entrar. Eve riu.
― Não pode entrar, monstro.
― ela disse ― Não sem minha permissão.
― Eu não estou nem aí pras suas regras, vadia. ― retruquei ―
Eu não abaixo a cabeça para nada e nem ninguém.
― O que pretende fazer, então, monstro?
― Eu já disse que eu não sou um monstro! ― gritei.
Girei a faca em minha mão, mirando-a para baixo. Um
movimento rápido e preciso. A faca cravou-se dentro do pentagrama que eu não
conseguia alcançar. Eu estava certo. Eve rugiu, cuspindo sangue.
Hector e Lucas, enfim, se ergueram. Estavam livres de Eve. E
ela, estava com problemas agora. Lucas apanhou o taco outra vez e Hector fez
algo que não víamos desde que nos encontramos. Ele estendeu suas asas.
De suas costas, o par de asas se mostrou tão grandes quanto
seu carro. E igualmente vermelhas. Asas de sangue. Ele as agitou, apagando as
velas que iluminavam o cômodo. Estávamos no escuro. O que me ajudou em meu
ataque furtivo.
Visão noturna. Uma benção e maldição ― por isso os óculos
escuros o tempo todo.
Um soco. Um chute. O som de madeira acertando alguma coisa.
Outro chute. Madeira. Soco. Apanhei a faca rapidamente e cravei-a no ventre de
Eve, abrindo-a de baixo para cima.
Acendi meu isqueiro com o silêncio.
― É, essa é uma maneira diferente de cravar firme em alguém ― Lucas comentou, vendo o corpo dividido de
Eve ― Mas, acho que foi melhor para o caso, Lunewalker.
― Ah, cala a boca, Baker ― respondi, limpando a faca na
barra da camisa ― E a garota, Hec?
Hector se abaixou, tomando-a no colo.
― Morta.
― Pena... ― comentei ― O que fazemos com ela?
― Não sei, parece que está morta à alguns meses... Vou
tentar achar alguém que esteja procurando por ela, mas é só o que podemos
fazer. ― ele respondeu.
― Certo.
Apanhei minha pistola de volta, guardando-a na cintura,
junto da faca.
Hector fechou suas asas sobre a garota, que desapareceu
quando ele as reabriu. Lucas apoiou o taco sobre o ombro, sorrindo.
― O que fez com o corpo?
― Está em minha casa. Em meu refúgio.
― Entendo ― ele alargou o sorriso ― Mas e agora, o que
fazemos?
Silêncio.
― Bar? ― sugeri.
V
De volta ao mesmo bar onde tudo começou. A tradição do
Lunewalker. Após uma demanda bem
sucedida, era preciso comemora-la. Era preciso um pouco de diversão após o trabalho.
Hector ergueu o copo, em um brinde, que nós acompanhamos.
Sorrimos e bebemos. A bruxa malvada estava morta, uma garota morta,
provavelmente, estaria sendo devidamente enterrada pela família preocupada.
E nós?
Nós estávamos à vontade outra vez em nosso devido lugar. O
bar Princesa. Eu observava o lugar a
nossa volta, Hector e Lucas discutiam os detalhes de nossa aventura.
Eu estava a procura de alguma coisa, mas as vozes em minha
mente não me diziam o que era. Talvez não existisse algo pelo qual eu buscasse,
talvez eu procurasse apenas por procurar, sem saber o motivo. E como eu não sei
o que procuro, nunca vou saber quando encontrar. Ou talvez eu descubra o que
procuro quando encontrar.
Só poderia saber quando acontecesse, mas naquele momento, eu
estava bebendo com meus amigos. E era isso que importava naquele momento. Isso
e a próxima cerveja!
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