13 de agosto de 2013

Conto ― A próxima estação

                Eu sou Jack. E este é um dos capítulos da minha vida. Não sei quando ou como começou, eu sei apenas que ele começou. Assim como todos os capítulos da vida, eu escrevo. Escrevo por que não confio na memória humana. Ela é falha e facilmente corrompida. Eu escrevo para que momentos não se percam, nem os bons e nem os maus.
                As pessoas têm diferentes interpretações sobre como tratam suas vidas. Para alguns cada dia é um quarto, para outros é uma estrada. Para mim, desta vez, este capítulo é como se eu estivesse dentro de um ônibus acompanhando suas paradas e vendo as pessoas que sobem e descem; cada uma delas com seus objetivos e, às vezes, encontram-se comigo.
É interessante pensar nisso. A visão humana é tão diferente sobre coisas tão iguais.
O silêncio de meu quarto só é quebrado pelo som de meu teclado. A madrugada sempre me foi tão mais familiar e aconchegante do que qualquer outra parte do dia. E é durante esse período em que eu posso ser eu mesmo por completo. Não que eu seja outra pessoa, mas, durante o dia, eu não consigo ser eu. Durante a solidão da madrugada, quando estou completamente sozinho, eu consigo isso. Escrevo, leio, penso, converso. Tudo isso acompanhado de mim mesmo.
Noite passada eu estive com alguns amigos, que, por acaso, moram comigo, em um show. Um show interessante, como em todas as terças-feiras em que saímos. Estamos ali. Sempre. É algo rotineiro que acaba nos dando uma forma de escapar da rotina. Aqueles shows nos dão a liberdade que procuramos durante todo o restante da semana.
Mas eu acabo me aborrecendo quando coisas espontâneas se tornam costumeiras. Eu me entedio facilmente com aquilo que, no começo, me fazia tão bem. E aquela rotina de fugir da rotina nas terças-feiras já começava a me aborrecer. Era uma pena, os shows costumavam ser tão bons. Divertiam-me, mas eu voltava para casa e não tinha mais vontade de fazer coisa alguma, exceto dormir.
A terça-feira em questão foi diferente.
Estávamos lá. Curtíamos o show, bebíamos cerveja com o pouco de dinheiro que conseguimos arrecadar para aquelas ocasiões e tínhamos apenas um único maço de cigarros para dividir em três.
O lugar não estava tão cheio, parecia um ambiente familiar ― um ambiente de família de motoqueiros, mas ainda assim ―, então, eu decidi caminhar um pouco. Procurar algo que pudesse me distrair. Apanhei um cigarro e o acendi. Após o primeiro trago, olhei a minha volta e, enquanto a fumaça que saia de minha boca se dispersava, observei as pessoas. Famílias, amigos e casais.
Enquanto caminhava, esbarrei em alguém, meu cigarro quase caiu e eu já estava pronto para xingar a pessoa quando percebi quem era. Bem, eu não sabia exatamente quem ela era, mas eu gostaria de saber.
Uma garota mais baixa do que eu, de cabelo escuro e com um vestido tão escuro quanto, com uma jaqueta de couro por cima. A maquiagem parecia roxa, mas eu não saberia dizer ― afinal de contas, não sei distinguir cores... Não tenho essa capacidade física no olho direito e meu esquerdo se adaptou a ignora-las.
Murmurei um leve pedido de desculpas e ela saiu dali sorrindo. Ela parecia uma garota legal. Naquele momento o único pensamento que eu tinha era de que eu queria conhece-la. Eu precisava. Sabia que minha mente não iria me deixar em paz se eu deixasse as coisas assim.
O lado ruim?
Bem, meus amigos me encontraram e com isso não pude encontra-la mais. Vi de relance algumas vezes, próxima ao palco, mas não pude falar com ela naquela noite ― a música era realmente envolvente e eu estava empolgado outra vez.
Nós voltamos a pé para casa ao final do show, eles discutiam as músicas tocadas e eu, em silêncio, terminava o meu último cigarro daquela noite. Meus amigos estavam ocupados o suficiente para perceber que eu não estava participando da conversa.
Já em meu quarto, tirei meus tênis e a camisa, deitei-me em minha cama bagunçada, tentando olhar o meu teto. Tirei os óculos escuros e virei-me para tentar dormir.

Aquela garota ainda estava em meus pensamentos e parecia que não iria sair deles tão cedo.

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