Eu
sou Jack. E este é um dos capítulos da minha vida. Não sei quando ou como
começou, eu sei apenas que ele começou. Assim como todos os capítulos da vida,
eu escrevo. Escrevo por que não confio na memória humana. Ela é falha e
facilmente corrompida. Eu escrevo para que momentos não se percam, nem os bons
e nem os maus.
As
pessoas têm diferentes interpretações sobre como tratam suas vidas. Para alguns
cada dia é um quarto, para outros é uma estrada. Para mim, desta vez, este
capítulo é como se eu estivesse dentro de um ônibus acompanhando suas paradas e
vendo as pessoas que sobem e descem; cada uma delas com seus objetivos e, às
vezes, encontram-se comigo.
É interessante
pensar nisso. A visão humana é tão diferente sobre coisas tão iguais.
O silêncio de
meu quarto só é quebrado pelo som de meu teclado. A madrugada sempre me foi tão
mais familiar e aconchegante do que qualquer outra parte do dia. E é durante
esse período em que eu posso ser eu mesmo por completo. Não que eu seja outra
pessoa, mas, durante o dia, eu não consigo ser eu. Durante a solidão da
madrugada, quando estou completamente sozinho, eu consigo isso. Escrevo, leio,
penso, converso. Tudo isso acompanhado de mim mesmo.
Noite passada
eu estive com alguns amigos, que, por acaso, moram comigo, em um show. Um show
interessante, como em todas as terças-feiras em que saímos. Estamos ali.
Sempre. É algo rotineiro que acaba nos dando uma forma de escapar da rotina.
Aqueles shows nos dão a liberdade que procuramos durante todo o restante da
semana.
Mas eu acabo
me aborrecendo quando coisas espontâneas se tornam costumeiras. Eu me entedio
facilmente com aquilo que, no começo, me fazia tão bem. E aquela rotina de
fugir da rotina nas terças-feiras já começava a me aborrecer. Era uma pena, os
shows costumavam ser tão bons. Divertiam-me, mas eu voltava para casa e não
tinha mais vontade de fazer coisa alguma, exceto dormir.
A terça-feira
em questão foi diferente.
Estávamos lá. Curtíamos
o show, bebíamos cerveja com o pouco de dinheiro que conseguimos arrecadar para
aquelas ocasiões e tínhamos apenas um único maço de cigarros para dividir em
três.
O lugar não
estava tão cheio, parecia um ambiente familiar ― um ambiente de família de
motoqueiros, mas ainda assim ―, então, eu decidi caminhar um pouco. Procurar
algo que pudesse me distrair. Apanhei um cigarro e o acendi. Após o primeiro
trago, olhei a minha volta e, enquanto a fumaça que saia de minha boca se
dispersava, observei as pessoas. Famílias, amigos e casais.
Enquanto
caminhava, esbarrei em alguém, meu cigarro quase caiu e eu já estava pronto
para xingar a pessoa quando percebi quem era. Bem, eu não sabia exatamente quem
ela era, mas eu gostaria de saber.
Uma garota
mais baixa do que eu, de cabelo escuro e com um vestido tão escuro quanto, com
uma jaqueta de couro por cima. A maquiagem parecia roxa, mas eu não saberia
dizer ― afinal de contas, não sei distinguir cores... Não tenho essa capacidade
física no olho direito e meu esquerdo se adaptou a ignora-las.
Murmurei um
leve pedido de desculpas e ela saiu dali sorrindo. Ela parecia uma garota
legal. Naquele momento o único pensamento que eu tinha era de que eu queria conhece-la.
Eu precisava. Sabia que minha mente não iria me deixar em paz se eu deixasse as
coisas assim.
O lado ruim?
Bem, meus
amigos me encontraram e com isso não pude encontra-la mais. Vi de relance
algumas vezes, próxima ao palco, mas não pude falar com ela naquela noite ― a
música era realmente envolvente e eu estava empolgado outra vez.
Nós voltamos a
pé para casa ao final do show, eles discutiam as músicas tocadas e eu, em
silêncio, terminava o meu último cigarro daquela noite. Meus amigos estavam
ocupados o suficiente para perceber que eu não estava participando da conversa.
Já em meu quarto,
tirei meus tênis e a camisa, deitei-me em minha cama bagunçada, tentando olhar
o meu teto. Tirei os óculos escuros e virei-me para tentar dormir.
Aquela garota
ainda estava em meus pensamentos e parecia que não iria sair deles tão cedo.
Amei o conto e espero que tenha uma continuação.
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