21 de julho de 2013

Conto do Luneverso — O Andarilho e a Valquíria

            A Estrada. Sempre me pareceu o lugar certo para minha vida. Mesmo com a chuva, o sol forte, a solidão... Eu sempre me senti a vontade enquanto estava nelas. Estradas que levavam a muitos lugares e também a lugar nenhum.
            Parei minha motocicleta próxima à autoestrada e observava o céu noturno. Procurei em minha jaqueta por um cigarro. Levei o cigarro aos lábios e acendi-o, tragando-o e, lentamente, soprando a fumaça.
            Enquanto observava as estrelas, alguns caminhões passavam por mim, às vezes, também, alguns carros e, raramente, alguma motocicleta. Aquela não era uma estrada muito popular. O que era uma pena, a visão que se tinha dali era espetacular. Mas para perceber a pessoa precisaria mesmo querer ver, muitos passam olhando sem, verdadeiramente, olhar.
            Terminei meu cigarro e fiz minha prece a Lua. Montei em minha motocicleta e parti dali. Tinha um trabalho a fazer.
            É eu tenho meu “trampo”. Caçador de monstros é o que eu sou. Sou um desses poucos malucos sociopatas que pecam para que outros não precisem pecar. Um desses caras que alivia o peso das costas dos outros tomando-o para si. Um herói é o que dizem, mesmo que eu não me considere um. Eu sou o que sou por que é só o que sei ser. Não que eu não goste, mas costumo me perguntar algumas vezes como deve ser... Ser um civil.
            Caçar é mais complicado do que parece. Temos que encontrar o caso, saber o que estamos caçando, saber como matar e depois... Bom, matar.
            Não foi complicado dessa vez, apenas um vampiro que precisava de umas boas pancadas pra se encaixar no seu bando. Como ele não entendia, acabei precisando mata-lo. Antes ele do que eu.
            Voltei para o quarto de hotel em que estava hospedado. Uma pocilga, diga-se de passagem, mas como já estava pago... Eu precisava usar. E também precisava de um banho. Não é legal ficar fedendo a sangue podre.
            Quando saí do banho, prendi meu cabelo em um rabo de cavalo baixo e apanhei outro cigarro. Abri o frigobar e apanhei uma cerveja, podia me dar esse luxo dessa vez. Sentei sobre a cama e liguei a televisão. Nada de interessante estava passando, acabei deixando nos desenhos.
            Minha cerveja estava pela metade quando bateram em minha porta. Estranhei, não conhecia ninguém naquela cidade e não havia pedido serviço... E não poderiam ser do hotel, eram três da manhã!
            Apanhei minha faca de prata e fui até a porta.
            Parada sob o portal estava uma jovem com o corpo com curvas certas e mais baixa do que eu, pele pálida. O cabelo escuro ocultava-lhe parte do rosto, indo parar sobre seu busto não muito avantajado. Vestia roupas simples, camiseta preta, jaqueta escura, jeans e um tênis. O que chamava atenção era o pingente em sua pulseira na mão direita. Um martelo de prata.
            — H-uh, achei que nunca mais veria você, pequena Valquíria. — comentei tomando mais um gole de minha cerveja — Entra aí.
            — Andarilho. — cumprimentou-me quando entrou — Como tem passado?
            Fechei a porta e terminei a cerveja antes de respondê-la.
            — Bem para um mortal. Acabei de terminar um trabalho e estou... Er, comemorando a minha maneira — indiquei a garrafa vazia — Pode me passar meus cigarros?
            Ela apanhou o maço sobre a cama e jogou-me. Tirei um e acendi, guardando o maço no bolso da calça. Após o primeiro trago, ela disse:
            — Eu soube. Por isso vim te ver. — ela sentou sobre a cama, jogando a toalha molhada no chão — Nojento...
            — É só uma toalha molhada — respondi deitando-me ao lado dela, oras é minha cama! — O que quer comigo? Da última vez queria me levar embora daqui. Eu consegui me virar bem sem qualquer ajuda divina, mesmo nórdica.
            — Eu soube disso também. Você é mais falado do que imagina, Andarilho.
            — Não me chame assim. Eu tenho um nome, você sabe disso. — ralhei — Jack é meu nome. Andarilho é apenas parte do meu sobrenome.
            — Eu prefiro te chamar de Andarilho, mas se faz tanta questão...
            — Agradeço Valquíria. — levei o cigarro aos lábios e traguei. — Mas ainda não me respondeu. O que você veio fazer aqui?
            — Estava apenas de passagem. Eu queria ver como estava.
            — Queria se certificar que eu ainda não morri e fui apanhado por alguém que não é você?
            — Algo assim.
            — Eu já te disse, minha servidão é a Luna. Não sou nórdico.
            — Eu o escolhi, não me pergunte por que, apenas escolhi. E isso não é algo que se nega. — disse ela — Nem queira ver o que acontece com quem nega algo a Odin.
            — Ele não sabe lidar com um simples “não”? Seu pai parece um cara esquisito.
            — Ele só tem o gênio forte... — justificou ela — No fundo ele é bom.
            — Bem, eu estou vivo, inteiro e pronto para a próxima briga. — respondi levantando-me da cama.
            Peguei minha jaqueta, coloquei a mochila nas costas e apanhei o capacete. Depois daquela conversa, eu precisava sair dali. Precisava de um pouco de ar. E também precisava chegar a minha própria casa, mesmo com meu padrinho lá para me dar alguma bronca.
            Quando eu estava próximo à porta, ela me chamou. Virei para trás e ela estava muito próxima a mim. Ergueu-se um pouco e selou seus lábios sobre os meus. Fiquei confuso, estava paralisado sem saber o que estava acontecendo.
            — É pra dar sorte — disse ela — Cuide-se, Jack...

            Pisquei e ela havia desaparecido. Saí dali, em direção a minha motocicleta, dei a partida e parti rumo à estrada. Aquela havia sido uma noite estranha.

Um comentário:

  1. Adorei a fantasia presente no conto. Você escreveu maravilhosamente bem. Parabéns!

    Beijo
    Mariana | Sem querer me intrometer

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